Poema ao Jornalista
Ninguém te vê. Nem o homem sério de óculos que se sentou de pijama na cadeira de palhinha na calçada de um subúrbio qualquer, nem a mulher gorda que tira os óculos e chora por causa do assassinato hediondo -o homem que matou seis filhos e bebeu veneno-, pelos dez órfãos da mãe desesperada. Ninguém te vê, nem o rapaz que discute política na mesa do café, nem a moça que procura o seu nome na crônica social, na qual a caridade fica muito mais bonita e na qual ela se sente muito mais humana...
Ninguém te vê. Estás sentado na tua mesa, entre papéis dispersos. Na tua mesa e na tua cabeça há uma prodigiosa procissão de coisas diversas, que se atropelam como os homens na rua na mudança do semáforo.
O ladrão assaltou o apartamento de Copacabana, um aniversário, Marieta que cortou o pulso pela décima vez, dez mil aviões desovando bombas, o jantar elegante no "grill" do cassino, a mulher que teve quatro gêmeos, a crônica sobre o vestido de grife, o político que promete um mundo melhor, o operário que caiu do 5 ° andar, o quilo de feijão a 3 cruzeiros, o último gol do América - tudo isso está na tua cabeça, que é o mundo debruçado sobre um bloco de papel.
Ninguém te vê. Mas tu vês o mundo, tu sentes o mundo, cada dia, cada noite. E, daqui a pouco, e amanhã bem cedo, terás milhões de olhos, de consciências, porque difundirás na multidão e andarás na multidão como os pés no corpo.
És tu que mudas todos os dias a alma das multidões, dá-lhes novo alimento, nova água, novas preocupações, novas alegrias, ou novos tormentos. Depois do sol, é a tua manchete que brilha mais, e que clareia. Depois da noite, é a tua manchete que enluta o mundo e encobre os homens.
Ninguém te vê. E existes e estás presente em toda parte como Deus, nas ruas, nas batalhas, no avião que ronca no céu, no navio que não chegará, na hora do fuzilamento, no recado para a família, na festa do ministro, no banquete do político, na cadeia. Tens mil olhos, mil ouvidos, mil almas, mil mãos, estás em toda parte e ninguém te vê... até o momento em que explodes na rua como uma granada e a tua voz é o hino de mil letras dos homens heterogêneos e dispersos...
Alma nova do mundo a cada novo dia. Música das ruas todos os instantes. História efêmera que passa e a memória esquecerá se os livros não lembrarem; sem ti, reduziríamos o mundo ao alcance dos nossos olhos, e ficaríamos surdos e mudos, e de tal forma haveria silêncio e deserto ao redor...
Sem ti, o mundo seria mundos, muitos mundos, o meu, o teu, o dele, mundinhos de cada um; nunca um mundo só, nosso mundo, imenso mundo, mundão, que sai da tua cabeça e escorre da tua mão!
PARABÉNS A TODOS OS JORNALISTAS!!